sexta-feira, novembro 28

surpresa!

não sou dada a levantar bandeiras porque os homens de branco me proíbem de paletear todo pesinho além do meu, que já é considerável, ô. tá, tô sendo rasteira, confesso: eu abomino gente panfletária, por mais justa que a causa possa ser. ativista, em tese, é um bicho chato bragarai. às vezes, até cheira meio mal.

nessas, uma das poucas cousas que me motivam a abrir o berreiro é a nefanda indústria automobilística, responsável por fermentar a sanha consumista dos neomotoras que infestam qualquer ruela deste mundo de meu google.

não sei dirigir, não quero aprender e tenho raiva e pena de quem sabe. carro de praça é troço bem bom nesta vida. carona de amigo/irmão/camarada serve pra te levar pra praia com conforto de rainha. e avião é a alternativa preferencial quando a pernada ultrapassa os 300 quilômetros de distância.

por conta da minha aversão a autos próprios, tô livre de passar pelo que passou alguém aqui da vizinhança, dia desses. descia eu a rua ao lado e testemunho um senhorzinho chamar a pessoa pelo porteiro eletrônico:

pronto! - responde a voz feminina.

bom dia! - engata o cabra.

si-im? - titubeia a vizinha, meio desconfiada e já pronta a despachar o talvez vendedor d'alguma cousa qualquer.

senhora, o citröen vermelho bem novinho estacionado aqui na frente do prédio é deste apartamento? - manda o tiozão.

é, sim - devolve a moçoila, sem sequer imaginar o que viria pela frente (ou pelo lado, ou por trás).

e veio. sem dó:

olha, eu bati nele agora mesmo. estragou bastante. a senhora pode descer aqui?

ouch.

overesquizoparanóia

e contorce-se o doidão: eu sei que tem mais gente escutando quando eu converso em silêncio comigo mesmo.

a ostensiva porquice da burguesia

ah, eu deveria ter desconfiado. o que poderia rolar numa inauguração em que o verissimo (compreendam: a natureza deste post exige pelo menos um link para a indelével caras) sopra vigorosamente seu sax e fala pelos cotovelos, enquanto a adriana calcanhotto autografa... livros?

foi a da primeira fnac (hip hip hurra!) da sorridente capital, assentada no novo - e metido a besta - barra shopping sul.

formadores de opinião (uia!), 98% do pib gaúcho e toda a sorte de esnobes e botoxentos disputavam a murros flûtes plásticas de miolo terranova e caixotinhas com cuscuz marroquino nadando em curry (valha-me, raçuda comida campeira!).

os (in)competentes organizadores da boca-livre esqueceram-se de espalhar lixeiras pela lojona e a excelsa elite gaúcha, com preguiça de arranjar lugar apropriado pra desovar os despojos, achou por bem dispensar a nojeira sobre a nobre mercadoria à venda.

o cenário era bisonho: filmes do buñuel milimetricamente cobertos por uma farofa amarelada e ensebada. ipods salpicados de álcool carbonatado. saramagos finamente decorados com migalhas de brownie. do chão, nem falo, que grossura pouca é bobagem, néam, meu filho.

e eu que, repugnantemente, insinuei dia desses que o novo e impoluto empreendimento logo seria conspurcado pelas hordas de maloqueiros moradores das adjacências, obrigo-me a morder minha pérfida lingüinha (tremas, sim, tremas, antes que a farra acabe): os verdadeiros selvagens vivem em triplexes, dirigem reluzentes audis e passam as férias em santorini. ou abduzem multidões meios de comunicação afora. ou tudo isso ao mesmo tempo.

nem o mais puro-sangue vileiro seria capaz de perpetrar aquela imundície. enquanto os serviçais recolhem os restos, passa a caravana de suínos pós-graduados. acumulando pérolas e granjeando fama, comme il faut.

quarta-feira, novembro 19

sim, este blog é uma fraude

se antes nem suspeitavam, agora meus fiéis e generosos leitores já sabem: eu minto deslavadamente. é: não veio e não virá o post sobre o 15º poa em cena. preparei fotos, fiz o escambau, mas demorei demais. ah, tô velha, perdi meu livrinho de notas e esqueci tudo o que tinha a dizer sobre o festival. entendam, ora bolas.

só lembro que o zé celso martinez e sua bandidaaage chegaram perto, mas não me arrebataram tanto quanto o théâtre du soleil na edição de 2007. se bem que a cena do papa sendo açoitado com camisinhas (na sua seqüência mais inocente...) é antológica. quase lá.

hum, bom, e teve a obscena senhora d, cuja performance da atriz, suzan damasceno, me desatarraxou a bunda todinha. e quem já me viu de perto sabe que isso não é pouco... acachapante.

e as gurias das margaridas enlatadas que, orientadas pela minha queridoníssima amiga gisela habeyche, deram de relho (oigalê, tchê!) na adaptação de quatro contos do caio f. cousa marlinda.

e o que foi aquele tal teatro físico dos espanhóis do loscorderos.sc em crónica de josé agarrotado (menudo hijo de puta)? vertiginoso. e tudo pra falar sobre como é difícil falar. e escutar. é... viver dá um puta trabalho, meu nêgo. que o diga o suor que pingava dos guapos só cinco minutos depois de iniciada a correria. emblemático.

outro gol? determinadas pessoas: weigel, (demi)monólogo assinado com a maior catega pelo ariel borghi, e com su mamá, esther góes, encarnando a destemida helene weigel, a grande mulher por trás de bertolt brecht. caprichado e comovente.

e eis que chegamos ao mito peter brook, que desta vez trouxe a nós, mortais meridionais, um excerto de os irmãos karamázov, cujo autor, fiódor d., como caio f., hilda hilst e brecht, dispensa links e demais obviedades. incorporando o grande inquisidor, o bretão bruce myers se cospe todo, mas confirma a máxima brookeana de que menos é mais, basta ser fodão. peixe grande, meu filho.

do show da laurie anderson só saíram decepcionados os que ignoravam quem fosse aquela menuda figurinhaça de cabelos espetados ou aqueles que achavam que ela teria eternamente o fôlego cênico dos 30 e poucos anos. não tem, mas como ela própria preconiza, only an expert can deal with the problem. e a senhora lou reed, ninguém ouse duvidar, é perita no que faz. só para iniciados.

já a conterrânea adriana calcanhotto deveria sempre, mas sempre mesmo, se apresentar com banda completa, abolindo definitivamente da sua carreira o tal formato banquinho-e-violão. apoiada por aqueles craques da pauta, a ex-contida artista até roqueira ensandecida virou. e classuda pacas.

quanto ao fausto, do nekrosius, vacilei bonito (igual à produção do cara, que mandou os cenários pra buenos aires, em vez de porto alegre...). na tarde do grande dia fui acometida por súbito e violento torcicolo. hipocondríaca cuidadosa que sou, tratei de derrubar rapidinho um miosan daqueles. resultado: dormi a sono solto durante quase todo o primeiro ato. chateadinha, fui ressonar em casa. e era bonitaça a peçona. que pena.

antes disso, rolou tio vania pelos olhos do celso frateschi. texto clááássico, diretor tarimbado, cenário elegante. e nada disso foi capaz de empolgar. muito menos aquele elenco irregular - pra dizer o mínimo. ui! ficou devendo horrores.

menos pior, no entanto, que o antonio abujamra e seu começar a terminar. disfarçado de reverência ao absurdo beckettiano, foi o maior engodo do 15º poa em cena. o velho abu, de inesperado headset e preocupadíssimo em esconder a barrigona sob o figurino matrix, deve estar mal das pernas. caça-níqueis constrangedor.

las relaciones de clara fui coagida a passar: era no mesmo dia do fausto, que teve só uma apresentação por causa da trapalhada com os cenários. lamentei, que queria rever a alejandra cortazzo (do fodástico 4:48 psicosis, ano passado) em cena. quem teve a sorte de conferir a montagem, disse que a hermana, então acompanhada por um elencão, repetiu a dose. perdi, raios!

anticlássico, a última perna da maratona, me encontrou cansada de guerra. tava marcado pra domingo tarde da noite, lááá no goethe, chovia hectolitros e a gente temia ser uma bomba. não fomos. até agora não tenho qualquer certeza de que dava mesmo pra ter faltado. melhor nem saber.

como? eu disse que não ia rolar post sobre o em cena este ano? hahahaha! eu minto, vocês ainda não se convenceram?

ano que vem tem mais. e, até lá, quem sabe eu corrija mais esse meu desvio de conduta.

evoé, negada!

terça-feira, novembro 18

i just wanna get along

no princípio eram os elfos e aquela excitante alternância entre céu e inferno, urros e sussurros, extraterrestres e surfistas, três acordes e lalalas. o sonho do pássaro do monte olimpo era a lei nas nossas pickups noventistas.

depois vieram as criadoras e a onda, então mais sacana e densa, quebrava sempre perfeita na minha praia. até happiness is a warm gun, ora vejam!, me fazia feliz. e eu só queria me dar bem. mas demorou. e quanto...

estava escrito: num dia quente de novembro, nos primórdios do 21º século cristão, eu finalmente estaria cara a cara com as criadoras. e elas compactariam o solo surrado da grande metrópole. e me fariam voar, como uma vez foi com o tal pássaro do monte olimpo.

e eu estava lá. e eu vi e ouvi tudo. e eu sabia que, a despeito da reverberação e da juventude perdida, a massa sonora e a performance incendiária seriam nada menos que o maior espetáculo da terra. the deal sis were glorious.

e agora eu já posso morrer megafeliz. cantem fortunately gone a plenos pulmões no minuto final, por favor.