segunda-feira, outubro 8

meu pódio

pois bem. por inacreditáveis dez pilas cada, enfileiramos 14 espetáculos no festival que acabou faz uma semana e pouco.

claro que tinha joio no trigo, sempre tem, neám. mas o trigo... aaaaahhh, delícia!

promessa cumprida: taí o meu ranking, em ordem crescente de belezura. há empates, que, como se sabe, a gostologia não é uma ciência exata.


11º lugar: no me olvides
como disse uma amiga, o primeiro show sem bis que vi na vida. e não foi por falta de vontade do cantante... o villalba pode ser um grande produtor cultural, um puta amigão de artistas gaúchos genteboa, mas não canta um ovo. e olha que a orquestra velázquez era bem decente. foi show pro cabra-hermano pegar mulher, boba, sopra o tinhoso que mora aqui no meu ombro direito. maldade!


10º lugar: el camino a la meca
china zorrilla é só uma respeitável octogenária que ainda atua. uma boa atriz, é verdade, mas nem isso a tal pecinha soube explorar direito. espetaculozinho chato, muuuuito chato. deu tanto sono que um sujeito na mesma fila em que estávamos roncou o quanto quis. não vi elsa e fred, mas, por alá!, certamente é menos pior que o tal caminho pra meca.


9º lugar: la divina
pois é. tinha tudo pra ser bom. o biño sauitzvy é um cara talentoso, o argumento prometia, o cenário era razoável, a música e a luz também. o nando messias, com quem tive o prazer de trabalhar no hitchcock ri, em 1999 e 2000, tava na jogada. mas foi um festival de deixas dramáticas desperdiçadas e a coreografia era tão já-vi-isso-antes que não deu nem pro início. pena.


8º lugar: crucial dois um
mais uma boa chance jogada fora. o gilson vargas, estreando no teatro, é um cineasta inteligente, o paulo scott, um escritor original pacas. o cenário e a luz faziam uma dobradinha pra lá de contemporânea. mas a boa impressão não resistiu à segunda cena. atores ruins (nervosos?), dicção horrenda, poder de convencimento zero. inda assim, saí da sala e tasquei três estrelinhas preles na ficha do júri popular do prêmio braskem. é teatro local, porra, eles merecem o reconhecimento. quem sabe reescolhendo o elenco, néam?


7º lugar: satolep sambatown
sou fãzoca do vitor e dou gritinhos de prazer com qualquer percussão bem executada. do marcos suzano, conheço muito pouco, e foi aí que a porca espiralou o rabo: fui ver os dois caras com uma puta expectativa, alimentada pelas declarações pré-show do vitor, de que a música dele passava longe do ritmo (harmonia rica é um prato cheio pra qualquer percussionista mais inspirado), e descubro que o suzano não é um ritmista no sentido exato da palavra e, pra mim, pouco acrescentou ao repertório do embaixador pelotense do frio (aliás, que penteadinho medonho, hein?). o que teve de melhor foi a canja da katia b e o vitor respondendo a um empolgado da platéia, que pediu 'ramilonga': 'nem pensar. esse é um capítulo encerrado da minha vida'. ufa, menos mal!


6º lugar: hoje é dia do amor
furor alegre na fila: texto porno-místico do joão silvério trevisan na boca de um sadomasoquista monologante. o risco era grande, mas podia ser bom. e era. menos o ator (ex-galã da malhação e das malditas chiquititas), cuja expressão vocal não convencia nem um cactus, embora tivesse um admirável condicionamento físico: mais de uma hora peladão (com os documentos contidos por CORRENTONAS de tamanho proporcional, se é que cs me entendem...), de joelhos, com os braços presos, não é pra qualquer macho. boas mesmo eram as referências religiosas (algo como 'o catolicismo é uma viadagem'. hahahaha!) e a derradeira frase: 'hoje é dia do amor, seus filhos da puta, e não vai ter final feliz porra nenhuma!'. mazá, iconoclastinha pintudo!


6º lugar: edmond
texto estranho, e a platéia ria-ria-ria das piadinhas racistas e homofóbicas. o protagonista, marco antônio pâmio, ganhou da APCA (associação paulista de críticos de arte) o prêmio de melhor ator, ano passado, pela performance e foi merecido: o cara é uma das melhores cousas da peça - que tem cenários inteligentes e seqüências quase cinematográficas. ainda dá pra melhorar bastante as passagens de cena, feitas pelo próprio elenco, que movimenta os painéis cenográficos pelo palco (claro que, nem de longe, se compara à proposta apurada e precisa do théâtre du soleil em les éphémères). no final, até dava pra perdoar as piadinhas de mau gosto: o personagem do pâmio termina preso, tascando uma bicotinha num puta negrão gostoso. yeah!


5º lugar: convergence 1.0
muito original o tal adrien mondot, com aquela gigante tapadeira translúcida na boca de cena, atrás da qual rola praticamente todo o espetáculo mezzo lúdico, mezzo techno. dá pra fazer pecinha boa brincando com bolas, bolinhas, bolões e softwares modernosos, sin jamás perder la ternura, viste cabrón? só acho que o cara precisa ser fodão de verdade numa aventura assim: não dá pra deixar as bolotas caírem, tem que treinar até doerem os bracinhos, meu filho!


4º lugar: prêt-à-porter 9
teatro minimalista em estado puro. a turma do CPT, leia-se antunes filho, uma gurizada esperta, como não poderia deixar de ser, trouxe à sorridente capital um espetáculo despojado, ainda que pretensioso, no bom sentido. tudo muito econômico e simples, porque teatro de verdade também pode ser feijão-com-arroz, é só questão de acertar o tempero. e isto a boiada escaldada do mitológico diretor sabe fazer bem - ou 'toma pau' do hômi. aqui eles escaparam das chibatadas. melhor pra todo mundo.


4º lugar: a gaivota - tema para um conto curto
enrique diaz é um cara de sorte: tá sempre cercado de gente talentosa e destemida. num outro poa em cena eu conferi 'a paixão segundo gh', da clarice lispector, e chapei com a qualidade da direção dele e da atuação da mariana lima, baita atriz que divide as contas de casa (e mais outras cousas) com ele. nesta livre adaptação de um dos clássicos do deus tchékhov não foi diferente. loucura total aquela metapeça - apeçadentrodapeçadentrodapeça. e as personagens que mudam de atoratriz. e a leveza, mesmo quando a cousa pesa. e o humor. e tudo. gostei de novo da turma do diaz. gostei mesmo.


3º lugar: 4:48 psicosis
sarah kane, como diz a mesma amiga que lembrou do show sem bis, é aquilo: a mulher se matou, e isso diz quase tudo. os deprimidos crônicos, como yo, hão de concordar que há beleza no fim do precipício. 4:48 psicosis repousa exatamente lá. e é genial, mas nada tão down nesta montagem. a gente até chega a rir com a atuação da alejandra cortazzo, uma das mais incensadas da nova geração uruguaia (é, china, o tempo passa...). a atriz é tão tudo que até a sarah kane fica menos heavy. eu vi e dou fé.


3º lugar: crave
os menos afeitos fugiriam de quatro atores sentados o tempo todo, quase imóveis, despejando um texto dolorido como é este. fugiriam de um cenário básico, sobre o qual se projetam, o tempo inteiro, só imagens abstratas, uns fractais preguiçosos, pouco coloridinhos. fugiriam de uma trilha sonora tensa, densa, monocórdia. fugiriam de uma luz fixa, sem variações. fugiriam, por fim, de mais uma marretada da dramaturga-suicida. eu não fugi, e vi na montagem enxuta do argentino cristian drut, um dos melhores espetáculos de toda a minha vida. eu não fugi. ueba!


2º lugar: big in bombay
eu sabia nada sobre a coreógrafa argentina constanza macras quando li o recado da fernanda no orkut: 'vou a porto alegre fazer big in bombay. não sei onde vai ser, mas vai lá ver!' como não? esse puta talento que me escrevia esteve aqui ano passado, encarnando uma comovente lady grey by felipe hirsch (outro deus do teatro brasuca), e me ganhou na hora. então, nem pisquei antes de atravessar a sorridente capital, sem imaginar a maravilha que me esperava. voltei pra casa felizona da vida com a zorra que o pessoal da macras armou no palco. tipo refeição completa, sabe? tinha de um tudo: dança, teatro, música, vídeo, literatura, artes plásticas. reflexão contemporânea e bem humorada sobre o lixo da fama, e sobre o que é viver num mundo que parece uma cousa só, apesar dos muitos que somos. só deixei em segundo lugar porque concorrer com a turma da cartoucherie é covardia... quer saber? se a fernanda estiver no elenco ou a constanza macras na direção, é só se jogar que não tem erro.


1º lugar: les éphémères
ulalá! o que dizer desta gente, mon pére? tudo parece tão óbvio e surrado diante da experiência inédita que eles nos ofereceram. o grande salão de jantar coletivo. os camarins expostos pra nos mostrar que a arte está ao alcance de todos que têm espírito livre e curioso. o espaço cênico chocantemente generoso. a simplicidade de quem está lá pra nos lembrar que teatro é um dos troços mais humanos que existem, rejeitando mesmo o glamour que costuma revestir o artista. a forma comovente de contar histórias, muitas. a riqueza de detalhes dos palcos móveis. o som de tudo. os pequenos enredos que, de tão comuns a quem nasce do homem, nublam os olhos logo de cara. a vida desfilou na nossa frente e eu estava lá pra guardar tudo isso bem direitinho aqui dentro. sou mais feliz por ter estado na cartoucherie do guaíba. sete horas e meia de dor na bunda e um encantamento que nunca, nunca, nunca vai se apagar. e eu ficaria mais o tempo todo lá.

2 comentários:

Drut disse...

muchas gracias por tu comentario sobre nuestro trabajo. Saludos desde Buenos Aires.

mimi aragón disse...

cristian: eu que agradeço pela visita gentil aos dois legumes e pelo belíssimo espetáculo. tua direção soube explorar na medida o enorme valor desse texto da sarah. e o elenco é de cair o queixo. saudações porto-alegrenses, cristian e cia. e, por favor, voltem sempre (ao blog e a porto alegre)!