sexta-feira, novembro 30

quinta-feira, novembro 29

ta-tumtum-shhhpá

toquei bateria imaginária quase a manhã toda.

os vizinhos amaram.

segunda-feira, novembro 26

de mãos dadas

não lembro muito bem como foi. eu era um toquinho, tinha uns 4 anos, no máximo. a maninha, ainda solteira, adorava brincar de mãe comigo e com a carol, as primeiras sobrinhas. então, numa tarde, eu fui com ela ao súper.

metida a adultinha, não quis me aboletar no carrinho: preferi ir no chão, de mão com aquela tia linda e engraçada e sempre cheia de novidades coloridas e modernas.

sei que a gente entrou num corredor, eu sempre grudada na mão dela, e ficamos (o que me pareceu) horas escolhendo alguma bobagem pra mim. dali a pouco, fui perguntar qualquer cousa pra ela e, quando olhei pra cima, não era mais a tia que segurava a minha mão: era uma mulher que eu nunca tinha visto na vida.

em pânico, me soltei da estranha e procurei a maninha, que tava no início do corredor, igualmente assustada, me catando com os olhos. corri pra ela e agarrei bem firme aquela mão familiar, pra não soltar tão cedo. até hoje não sei o que rolou. devo ter me distraído, destrambelhadinha desde pitoca, e trocado de mão sem perceber.

só o que restou daquela experiência foi a sensação apavorante que tive ao olhar pra cima e não reconhecer quem me segurava. uma tontura desagradável, o sangue congelado nas veias, o chão sumindo, o coração como que despencando no vácuo, trocando de lugar com o estômago embrulhado.

rigorosa e exatamente o que senti na quinta passada, dia 22, quando tocou o telefone e era a minha mãe com a surreal notícia de que a maninha tinha ido embora pra sempre, depois de não conseguir voltar da quarta parada cardíaca durante uma cirurgia de lipoaspiração em floripa, onde ela tinha se escondido há oito anos, depois de perder a filha tão amada.

o mundo parou ali pra minha cabeça rodar feito há 32 anos. na seqüência, vieram todas as cenas que ficaram gravadas da nossa relação nem sempre calma, mas cheia de passagens emocionantes e, na maioria da vezes, ternas e felizes.

numa noite quente do final de 1977, eu entrando de aia na nave da igreja santa terezinha, junto com a carol e a fernanda, no casamento da maninha com o caetano.

a minha boca aberta diante da sala de bagunça do primeiro apê deles, na descida da ramiro: toca-discos reluzentes, equalizadores, amplificadores, luzinhas piscantes, a maior coleção de vinis que eu já vi na vida, os inovadorérrimos videocassete betamax e o atari plugados na tevê, generosamente liberados pra nossa curiosidade infantil.

a maninha, aproveitando o sono pesado do caetano, pintando as unhas das mãos dele e depois dizendo 'ah, a acetona acabou e eu não posso sair pra comprar outra, porque tô tomando conta das gurias. vai lá na farmácia e compra tu mesmo, que eu tiro o esmalte pra ti. hahahahaha!'. e ele foi.

aquele natal em que eu e a carol ganhamos dos dois tios adorados uma barraca de brinquedo que virou nosso refúgio favorito.

todos os natais na casa da minha vó, quando eles chegavam lotados de sorrisos e pacotes brilhantes pra todo mundo.

eu furiosa, uma criancinha indomável que, quando contrariada, me ajoelhava e batia a cabeça no chão, aos berros. até o dia em que ela repetiu o ritual, bem na minha frente, e eu pude ver o quanto aquilo era insano. e nunca, nunca mais desfilei com galos gigantes na testa.

eu dizendo pra ela, que sempre tinha palpite pra vida dos outros, meu primeiro 'vai à merda, pô!'.

ela na maternidade, toda babada com a tão desejada tetê no colo, depois de três sonhos precocemente interrompidos. e eu, que de tão emocionada, ‘fiquei mocinha’ exatamente naquele 20 de maio de 1983.

nós em alegre bando num comboio pra torres, no verão de 84: eu e o caetano na frente, de bugue amarelo lotado de traquitanas, e ela atrás, com a tetê, num voyage 0km entupido de felicidade.

naquele mesmo verão, as nossas lágrimas comovidas, ouvindo o que a gente imaginava serem as primeiras sílabas da tetê (que a maldita paralisia cerebral nunca permitiu que se transformassem em palavras inteiras).

eu indo dormir na casa deles e os jantares suculentos que a gente inventava com as sobras da geladeira.

ela me levando no colégio, com a tetê toda risonha na cadeirinha do banco de trás do auto.

o meu orgulho de dizer pros amigos que a minha tia já tinha faturado ‘uma porção de prêmios de propaganda, até aquele tal de profissionais do ano, sabem?’.

ela, em choque, abraçando o caixão do caetano, depois do acidente estúpido que nos arrancou aquele cara bonachão e pleno de vida. e que me roubou o tio que foi meu pai, quando o verdadeiro preferiu outros caminhos.

de novo em torres, no verão seguinte à perda do caetano, a maninha clicando o meu retrato mais bonito de todos os tempos.

ela, parceira e debochada, me levando pra noite - uma festa chamada 'calor na bacurinha', em que, pra honrar o mimoso mote, cada uma foi pra um lado com seu respectivo rapazola. fizemos misérias e, depois, morremos de rir contando os detalhes uma pra outra.

ela, guerreira e devotada, criando sozinha uma filha linda, doce e carinhosa, que não falava, não caminhava, não quase tudo.

eu abraçada nela, no velório da tetê, dizendo 'tu não tá sozinha, minha véia, todo mundo aqui e eu te amamos muito'.

em floripa, a gente tomando cerveja num dia ensolarado no campeche, e lamentando a partida da cássia eller.

eu e a eva num aniversário dela, toda felizona, rodeada de amigos fiéis e canecões de chope.

no hospital, com a vó milinha perdendo a batalha de 15 anos contra o alzheimer, ela nervosa, fazendo cena com a chegada da minha mãe, com quem a relação sempre foi problemática e instável. eu levantando a voz com ela e pedindo respeito pelos últimos dias de vida da vó. eu magoada e, covarde, sem fibra pra limpar os pratos.

o e-mail que recebi dela no meu aniversário deste ano, que dizia bem assim:

Oi, Mimoca, minha sombrinha.

Feliz Aniversário, queridona. Tudo de bom de tudo que é bom pra ti, minha véia, ops, minha jovem sobrinha. Rsssss. Não te vi online e pensei: como posso beijar a minha sobrinha querida?

Aceitas beijinho desta tia ausente, bipolar, esquisita? Que o teu dia seja lindo e que o universo conspire para que todos os teus desejos se realizem neste novo ano. Beijos na Eva. Se vierem pra cá ou por aqui me avisem. Tenho saudades das risadas.

Te adoro, viu?

Beijooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooo

Maninha


e que eu, empedernidamente orgulhosa, não agradeci.

e agora esta ausência que não tem mais volta. e a raiva de mim mesma por não ter tido o peito e a humildade de dizer a tempo ‘ei, sua velha tia papuda ausente, bipolar e esquisita, a vida é curta, e é uma imbecilidade a gente perder tempo remoendo bostas. eu te amo, viu? te amo pra caralho!’.

apesar de não acreditar, tudo o que eu quero é que exista, sim, alguma cousa qualquer depois da vida. e que a maninha agora more numa estrela tão bonita quanto ela era. e, de lá, tenha a certeza de que eu vou sentir falta demais de segurar a mão dela.

fica bem aí, tia papuda, que, por aqui, a gente vai se virando.

sábado, novembro 17

it's enough to make one sick

não sou (muito) fresca, juro. só refugo mesmo quando o negócio é sangue, agulhas e quejandos, hospital e dor.

mas esse troço aqui me fez correr pro banheiro qual donzelinha ultrajada. oh, disgusting.

sexta-feira, novembro 16

ela que era triste riu

faz um tempo já. foi em setembro, rolava o porto alegre em cena.

fui tomar um café com a fernanda e ela me disse que conhecia quase nada do vitor ramil, tinha vontade de ouvir cousas do nosso barão de satolep. prometi que selecionaria o que eu considero a nata do cara e mandaria pra ela, que mora em berlim.

ouvi inteirinhos em seqüência, numa overdose, os álbuns que tenho aqui - tango, à beça, tambong (as duas versões, em português e espanhol) e longes - e pincei 30 canções. foi aí que a cousa tomou forma.

comecei a me sentir tristona da vida. chorava do nada, por nada. via criancinhas saindo do colégio de mão com as babás e desabava. passava na rua por carroceiros com cavalos raquíticos e me debulhava. ia nadar, planejava as cousas que tinha pra fazer durante a semana, almoçava, lia o jornal, via um comercial na tevê e pimba! lágrimas, soluços, peito apertado.

de onde vinha aquela tristeza toda? sabe lá. tava com as pílulas mágicas em dia, tudo certo, sem maiores angústias. sei que acabei desencanando, não ouvi mais nada do pelotense ilustre, e a misteriosa melancolia foi embora.

lesada, só há pouco me dei conta do que era (eu, que tenho meu palpite pra origem da tristeza crônica que abate a minha, a sua, a nossa geração).

fui tomar banho e programei o player pra tocar tambong no talo. no meio de valérie, ensaboando o lombo, comecei a chorar. assim, do nada. lágrimas grossas, pesadas.

sim, a origem da minha petit deprê é o vitor ramil. são aquelas harmonias de retalhar os pulsos. as melodias cruciantes. maldita estética do frio.

pior é que eu curto o cara. de verdade. vou pedir pro doutor felicidade um reforço na bupropiona. pffts! era só o que me faltava não poder mais ouvir o vitor.

terça-feira, novembro 13

cansou da comida de sempre?

estando no minho, e na mão, vá a'os telhadinhos.

(recebi do enorme c.a.t.)

quarta-feira, novembro 7

epidemia

diamante recolhido no monturo de lixo da tevê aberta:

a vida é uma doença sexualmente transmissível.

suíte:
tio aparício me repreende pela ignorância e desleixo: 'a frase é do ronald laing, bobinha. e tem um complemento imprescindível: 100% fatal. homem arrojado demais pro meu gosto, mas bom, esse laing'. então tá creditada a máxima, tio.

terça-feira, novembro 6

mais do mesmo do melhor

under the mountain, a golden fountain:


your former glories and all the stories:

segunda-feira, novembro 5

vaca azul vai me proteger enquanto eu andar distraída

anos 70, paralelo 30:

'mamanhê o que é cente, onde é que fica isso?', anseia a pequena vagenzinha.
'cente, filhote, como assim?', tenta clarear a consultada.
'cente, mamãe, cente. naquela música do sítio do pica-pau amarelo, o homenzinho canta: o sol NA CENTE é tão belooooo'...

a meninota também gostava de ouvir a avó conversando com as tias. e saía a repetir no colégio as expressões correntes em casa. ou quase:

'iolanda, tu não fez o tema? iiih... agora é tarde, inês é MARTA', papagaiava a precoce adoradora de frases feitas. sem, na verdade, entender o motivo da tal inês trocar de nome, e por que raios a cousa era tão trágica e definitiva.

os dias eram assim.

sexta-feira, novembro 2

bonde dos miolos entrevados

já repararam como a garotéia de hoje posa pra (toda e qualquer) foto diiishcontraííída? é fácil, são só dois estilões:

um
inspirados nos rappers, os marmanjos fazem cara de mauzão e exibem as patinhas dianteiras com indicadores e médios (às vezes também os polegares) horizontalmente estirados, abertos qual tesoura ávida.

outro
tocadas pelo espírito do funk periférico, as mocetonas capricham na expressão uiuiui e flexionam as pernocas, mãozinhas postas sobre os mocotós, empurrando as buzanfas pra trás no melhor estilo cachorra.

tem alguma cousa maligna desconhecida na água de beber ou será que foi mc'donalds demais e idéias próprias de menos?

e o que esperar do futuro, aijisuis? hordas e hordas fustigadas com bico-de-papagaio, apatia, artrite, alheamentos, fisgadas no ciático e toda a sorte de infelicidades ortopédicas e mentais. o apocalipse já começou.

quinta-feira, novembro 1

ortodoxo

o tio aparício é homem de curar dor de barriga com elixir paregórico. a maior concessão que ele faz à modernidade é escrever cartas semanais pra noiva octogenária, que mora em canguçu, numa olivetti lexicon 80.

dia desses, o sobrinho geek cismou de mostrar pro tio as maravilhas do last fm. foi soar o primeiro acorde de 'por una cabeza' e o troço desandou a mais carregar que tocar. rodava dois segundos, estacava cinco. lá pela quinta série de toca-pára, aparício perdeu a paciência:

- mas esse tal de bufferizando é pior que coito interrompido, che!

e foi fazer um escalda-pés no quarto de banho.