segunda-feira, abril 28

pequenas empresas, grandes negócios

padaria inferno.

só aqui:
quentinho,
a toda hora,

o autêntico
pão que o
diabo amassou.

facilitamos:
pague fiado,
coma agora.

e, acredite,
tem gente que
nunca provou.

alea jacta est

só pra não morrer na praia, pulou n'água e nadou até alto-mar. não apagou, sequer afundou. teve foi uma puta cãibra.

domingo, abril 27

saco cheio

tá na edição de domingo do tablóide local:

'o cartunista e escritor ziraldo alves pinto (...) só perde a paciência quando indagado sobre a indenização de mais de R$ 1 milhão em razão de supostos prejuízos financeiros durante a ditadura militar:

- vocês já encheram o meu saco com isso. (...)'


encheram mesmo, né, ziraldo? aliás, quantos sacos dá pra abarrotar com o milhãozinho e duzentos dele, mais o do senhor sérgio de magalhães gomes jaguaribe, e as pensõezinhas vitalícias de R$ 4,3 mil mensais que os dois pobres velhinhos vão amealhar do tesouro nacional, além daquelas que já recebem - mui justamente, aliás - do inss?

preocupada com a sobrecarga desses dois ilustres septuagenários, andei matutando uma forma de ajudar os coitadinhos a aliviar tanto peso. quem sabe, então, eles doam os sacos tão cheios pras famílias de quem se fodeu de verdade com a ditadura?

a do vladimir herzog, por exemplo, foi indenizada com risíveis R$ 120 mil, há mais ou menos 30 anos. a do mário fiel filho levou a fortuna de R$ 100 mil. hoje, a viúva do operário paulista assassinado no doi-codi recebe R$ 500 por mês da previdência social. os moradores da região do araguaia que foram torturados, presos e, alguns, mortos pelos golpistas de 64 deverão receber, no máximo, R$ 100 mil cada. e lambam os dedos.

enquanto isso, na zona sul do rio, os prejudicadíssimos cartunistas douram suas sofridas peles sob o sol do leblon e matam a sede com scotchs legítimos.

o hoje desafeto millôr já sacou a dos dois vovôs malandrinhos:

'eu pensava que defendiam uma ideologia, mas estavam fazendo investimento'.

o ivan lessa lembrou que nos anos 70, quando a repressão corria solta, o pai da supermãe vendeu à caixa econômica federal a imagem do jeremias, o bom (uma de suas três dezenas de personagens, que lhe renderam muitos, mas muitos sacos cheios), pra uso nas campanhas da loteca.

a petição que circula pela rede, a ser enviada ao ministério da justiça, fulmina o que restava de dois ex-respeitáveis cidadãos perseguidos pela milicada:

'há que se registrar a cupidez vergonhosa de dois jornalistas do nível de ziraldo e jaguar, que encerram suas vidas profissionais desenhando em tinta marrom a charge da desmoralização de suas lutas e da degradação moral de suas biografias. transformaram em negócio o que pensávamos ter sido feito por dignidade pessoal e bravura cívica. receberam, por décadas, o nosso aplauso sincero. agora, por dinheiro, escarnecem de toda a cidadania, chocada e atônita com a revelação de suas verdadeiras personalidades e intenções.'

é, de saco cheio andamos nós, senhor ziraldo, que vamos sustentar mais uma vileza de quem a gente menos esperava. tô flicts de raiva.

quarta-feira, abril 23

onan

a trilha é de um comercial que leva na campeã de audiência. cousa pra promover o cedê de uma dessas bilontras que enriquecem cantando iurdices travestidas de gospel.

a letra diz:

"preciso da sua mão
vem me levantaaaar"
.

ok, eu não presto.

sexta-feira, abril 18

diversão lapidar, bicho!

e então foi a nostalgia que me fez pescar na prateleira da locadora, no finde passado, o devedê de rc e o diamante cor-de-rosa. assisti ao filme uma única vez, quando tinha idade só pra deglutir papinha, e, naturalmente, não lembrava quase nada sobre a película protagonizada pelo régio trio jovemguardiano na virada dos 60 pra década em que esta tenra leguminosa estreou no mercado.

bendita seja, pois, minha amiga de fé, irmã et camarada nostalgia que, se já me compeliu a derramar hectolitros de sentidas lágrimas vida afora, agora me chacoalhou as moléculas com violentas gargalhadas ao longo dos 97 minutos dessa gema rara da sétima arte nacional. tá, briguei um pouco com o controle de volume, porque o som do filme (a bem da verdade, como o de todos aqueles produzidos por aqui até os anos 90) põe a pessoa doente. mas saiba o prezado que o entretenimento vale o sobe e desce do vu meter, viu?

ok: o roteiro é das cousas mais estapafúrdias já produzidas por terráqueos - uma mistureba de orientais, gênios e roqueiros dantanho se estapeando por tóquio, jerusalém e rio de janeiro numa impagável caçada a um tesouro milenar. a canastrice do rei, do erasmo e da wandeca só surpreende aqueles que há pouco aprenderam a comer com garfo e faca. a maquiagem do patético japa que conduz a trama merecia virar estudo de caso da toscologia. e quem se importa com tanta precariedade quando se tem a chance de topar, logo na abertura da belezinha, com o mítico rc demolindo tudo nesse protoclipe musical (e dizer que o cara deu no que deu, hein?):



e se o punch do reizão cutuca o nosso ponto g, o momento não-posso-acreditar-no-que-meus-olhos-vêem só poderia pertencer ao tremendão, na que elegi a melhor (porque a mais sem-noção) cena do filme:



por fim, apesar de muitos jurarem que o top musical rola na finaleira da aventura, com o trio cantando é preciso saber viver (nem adianta procurar o fonograma, que o troço não existe) a bordo de um jipão que lambe o asfalto da niemeyer, a canção mais fodona de todo o filme não tem o carimbo de nenhum deles: é assinada pelo jorge ben e ouvida na voz da gal costa, numa seqüência igualmente antológica:



depois dessa redescoberta preciosérrima, ando com água na boca pra rever os outros dois filmes do roberto farias que provam que o rei já foi, sim, papo firme: rc em ritmo de aventura, aquele da célebre cruzada de helicóptero por dentro do túnel do pasmado, também no rio, e rc a 300km por hora, mais mela-cueca que os anteriores, mas não menos clássico.

oh, tantas alegrias naqueles velhos tempos, belos dias.

quinta-feira, abril 17

mardita

quarta-feira, abril 16

selvagem e burra bandeira

tava demorando. finalzinho de março, quando circulou a notícia de que a pequena isabella tinha morrido depois de ser jogada de um prédio em são paulo, antevi o óbvio: ‘em dois tempos vai ter gente a valer levantando mais uma vez a bandeira burra e obscura da pena de morte’.

tá, era fácil, mas não deu outra: começou o tenebroso bramir. são os trogloditas travestidos de justiceiros (inclusive alguns com espaços nobres na tevê e no mais afamado periódico local) defendendo a mais bárbara das punições ainda remanescentes entre nós, as gentes do 21º século depois da suposta passagem do barbudo messiânico pela face da terra.

prefiro nem entrar no mérito do julgamento antecipado (ou precipitado?), porque os indícios (eu escrevi i-n-d-í-c-i-o-s, e não p-r-o-v-a-s) contra o pai e a madrasta são mesmo cabeludérrimos. habitualmente afoita, muita gente boa da dita imprensa já os condenou e o carneirinho que atende pelo nome de opinião pública foi atrás. no entanto, nem o pavoroso serial killer que mora em mim consegue imaginar que motivo – fútil, doente, cruel – haveria para dar cabo da menina. inegável é que há fumaça ali, muita fumaça. and it stinks. mas nem por isso nos cabe vestir a toga do juiz.

agora, morte é morte, némês? nosso fim ordinário e implacável, por mais que os movidos por qualquer crença queiram nos convencer de nobres significados místico-transcendentais. o ente cai duro e acabou – sem mais joie de vivre, mas também sem mais sofrimentos terrenos; esgota-se a vida, e isto é uma bela merda, mas e daí? investir uma autoridade do poder de decidir sobre a morte de quem quer que seja não constitui homicídio fantasiado de justiça? institucionalizar o assassinato é solução aceitável? morrer pela mão do estado pune de verdade? quando um homicida filho-da-puta frita na cadeira elétrica, tem as entranhas esturricadas por veneno, o peito aberto a tiros ou a cervical partida na forca, sua incalculável dívida está mesmo quitada?

pra esta reles blogueirazinha, não importa o quão bárbaro tenha sido um crime, é sempre fácil e brando demais pagar por ele com a vida. o sujeito vai lá, massacra um pobre coitado e ganha de presente a imolação oficial, a forma de justiça mais primitiva e grotesca que há: a do olho por olho, dente por dente – aquela que corta mão de larápio, incinera incendiário, tortura seqüestrador e viola estuprador, tudo com os cumprimentos dos selvagens cidadãos que legitimam o crime pelo crime, e ainda acham que assim combatem a violência. aí o facínora morre e pronto. não sofre um tiquinho só depois que a última onda elétrica lhe cruza os neurônios. pena capital, mais do que ignorância, primitivismo, cousa de involuídos, é absolvição da dívida. é perdão eterno. só não enxerga quem não quer - ou não consegue.

e no brasil? tanto pior, meu filho, que neste torrão a justiça é frágil e caolha. até as alfaces da ceasa estão murchas de saber que somos craques em condenar, preferencialmente, não-brancos e não-ricos, já que o que dá as cartas no patropi é a lei da bufunfa. o que não falta por aqui é magistrado corrupto, erro judiciário, ladrão de galinha encarcerado e tubarão solto.

hum, capto daí um pensamento: vossa mercê esbraveja contra a pena de morte porque nunca teve alguém do seu afeto sangrado por um animal desses. e eu respondo: é verdade, jamais fui alcançada por tamanha tragédia (tóc, tóc, tóc, bato na madeira). mas juro pelos meus dentes sem cáries que se algum dia (tóc, tóc, tóc, one more time, só pra garantir) essa mão lazarenta me tocar, estou pronta a controlar meu impulso (natural, pois que humano, demasiado humano) de carnear o desinfeliz com minha própria katana, porque de fato acredito que é impossível consertar violência com violência, que não se faz justiça com sangue. isto é cousa pra selvagens, montéquios e capuletos.

e qual é, então, a minha receita pra condenar um assassino repugnante? simples: põe-se o miserento a mofar na cadeia. é, prisão perpétua nele. e como nada sai de graça nesta vida, que o atroz trabalhe seis dias por semana - como a maioria de nós o faz - oito ou mais horas diárias lidando pesado, amóde custear sua estada vitalícia no xilindró. isto sim, e não a forca, é justiça da boa. ah, faltam presídios no brasil? pois que se plante a militarada toda a erguer masmorras seguras país afora. são todos jovens, fortes e bem alimentados, podem perfeitamente cumprir esse papel de inestimável valor penal e social.

que pena de morte, repito, não é castigo, é redenção. e quem defende essa burrice colossal, das duas uma: ou goza de poucas luzes ou é tão assassino quanto o réu.

segunda-feira, abril 14

dia de fúria

era um brasileiro bem-nascido. como fosse pouco, desde seu primeiro choro a família empenhou uma bagalhoça para tatuá-lo com princípios e modos irretocáveis.

passou metade da vida repetindo 'obrigado', 'o senhor me deu dinheiro a mais', 'com licença', 'ei, gerente, achei esta comanda em branco no chão', 'não tem de quê', 'vim devolver sua valise', 'bom dia', 'obrigado, não preciso comprar uma monografia pronta', 'por favor', 'tenha a bondade de passar na minha frente', 'não insista, não vou aceitar seu dinheiro' e demais obviedades da vida civilizada.

mas toda vez que se comportava qual gente, seus semelhantes lhe dirigiam olhares assombrados. assim como se o sujeito não fosse homem, mas um etê gosmento, aedes aegypt XXL, bacillus anthracis vertebrado, bichum estranhum emergindo do pântano de descortesia e gatunagem banalizadas na terra brasilis.

chegou um dia em que a índole desabou. havia sol e algum frio. depois de devolver o celular encontrado no banco de um táxi, correu atrás de uma velhinha numa rua do centro da cidade e zapt!: navalhou a bolsa da desprecavida. riu alto. e ninguém gritou nem 'pega ladrão!'. foi a glória.